terça-feira, 28 de junho de 2011

Festa de S. Pedro e S. Paulo

Ano A / Cor: vermelho / Leituras: At 3,1-10; Sl 18a (19); Gl 1,11-20; Jo 21,15-19

“Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja” (Mt 19,18)

Diácono Milton Restivo

O dia comemorativo de São Pedro é 29 de junho, enquadrado que é nas festas juninas, mas por ser uma festa de suma importância para a Igreja, comemora-se litúrgica e festivamente no primeiro domingo que o precede. Considerando que a tradição atesta que Pedro e Paulo, as colunas mestras da Igreja de Jesus Cristo foram martirizados no mesmo dia, então a Igreja festeja a memória dos dois Apóstolos no mesmo dia.
Além daquilo que é citado nos Evangelhos e nos Atos dos Apóstolos pouco se sabe sobre a vida de Pedro e dos demais Apóstolos. O livro dos Atos dos Apóstolos só narra a morte de Tiago, filho de Zebedeu no ano 44: “Nesse tempo, o rei Herodes começou a perseguir alguns membros da Igreja, e mandou matar à espada Tiago, irmão de João.” (At 12,1).
As informações, fora das Sagradas Escrituras, acerca dos apóstolos, são abundantes, e nem sempre meritórias de crédito. Temos que considerar que quando um escritor se propõe a escrever sobre um personagem, no caso um santo, o autor sempre carrega nas cores, fazendo com que os seus escritos sejam admirados pelas ações do personagem que ele focaliza, admira e, possivelmente, de quem é devoto, e a história sempre é uma escolha inspirada por uma ideologia ou crença ou uma devoção.

Por isso, quando falamos dos Apóstolos, não podemos sair da revelação, que é a própria Sagrada Escritura, e sempre levando em consideração a tradição dos primeiros padres (pais) da Igreja, como Clemente de Roma em sua Epístola aos Coríntios (escrita cerca de 95-97 dC), que fala sobre a morte de Pedro.
Pedro apaixonado, mas em quem não era seguro confiar, Jesus o transformou em um forte apoio na pregação do Evangelho. O caráter impulsivo e emocional de Pedro faz dele um estudo interessante. Pedro era um discípulo cujo coração estava no lugar certo, mas que cometia muitos erros. A história de Pedro nos ajuda a entender, principalmente, o papel das emoções na vida cristã.
 Que Pedro era casado, não se tem dúvida, considerando que os Evangelhos sinóticos citam sua sogra, que morava com ele, sem falar de sua esposa: “E logo ao sair da sinagoga (Jesus) foi à casa de Simão e de André, com Tiago e João. A sogra de Simão (Pedro) estava de cama com febre, e eles imediatamente o mencionaram a Jesus. E Jesus aproximando-se, tomou-a pela mão e a fez levantar-se. A febre a deixou e ela se pôs a servi-los.” (Mc 1,29-31; Mt 8,14-15; Lc 4,40-41).
Também Paulo diz que Pedro era casado e que levava sua mulher nas viagens apostólicas e missionárias: “Não temos o direito de levar conosco, nas viagens, uma mulher (esposa) cristã, como os outros Apóstolos e os irmãos do Senhor e Cefas (Pedro)?” (1Cor 9,5).
Das Sagradas Escrituras colhem-se os seguintes dados sobre Pedro: seu pai chamava-se Jonas no Evangelho de Mateus (Mt 16,17) ou João no Evangelho de João (Jo 1,42; 21,15). Tinha por irmão André (Mt 10,2), ambos pescadores de profissão (Mt 4,18; Mc 1,16). Pedro nasceu em Betsaida, uma aldeia pesqueira na costa nordestina do Mar da Galiléia. Betsaida, que significa Casa de Pesca, foi um lugar em que, mais tarde, Jesus operou muitos milagres, (Jo 1,44), mas Pedro morava na cidade de Cafarnaum quando conheceu Jesus (Mc 1,29; Lc 4,38). O primeiro encontro com Jesus foi à beira do mar da Galiléia onde Pedro e seu irmão André estavam pescando “... jogando a rede no mar, pois eram pescadores. Jesus disse para eles: ‘Sigam-me’, e eu farei de vocês pescadores de homens’. Eles deixaram imediatamente as redes, e seguiram a Jesus.” (Mt 4,18-20).
O nome de nascença de Pedro era Simão, abreviatura de Simeão, nome hebraico que significa “famoso”. Jesus lhe deu um novo nome: Pedro. Não lhe bastaria ser “famoso”. Precisava ser firme e inabalável. Afinal, firmeza era o que mais lhe faltava naqueles primeiros anos de serviço ao Mestre. Em seus momentos de debilidade, era chamado de “Simão” (Lc 22,31; Mc 14,37; Jo 21,15-17). Era o “velho homem” em ação, com toda a sua fraqueza natural.
Desde o seu primeiro encontro com Jesus, Simão recebeu o apelido de “kefa”, que em aramaico significa “rocha” ou “pedra”, traduzido para o português como “Cefas” (Jo 1,42), de onde vem “Pedro” nome este que foi traduzido para o grego como “Petros”, que também significa "pedra" ou "rocha", e posteriormente passou para o latim como “Petrus”, também através da palavra “petra”, de mesmo significado. Devido ao uso de mais de um idioma falado na Palestina e, em particular, na Judéia, era comum as pessoas possuírem mais de um nome: um hebraico, outro grego; ou um em latim, outro em aramaico, ou até mesmo dois nomes numa mesma língua. A mudança de seu nome por Jesus, bem como seu significado, ganha importância como vemos no Evangelho de Mateus, quando Jesus lhe diz: “Você é Pedro (pedra), e sobre essa pedra construirei a minha igreja, e o poder da morte nunca poderá vencê-la. Eu lhe darei as chaves do Reino do Céu, e o que você ligar na terra será ligado no céu, e o que você desligar na terra será desligado no céu.” (Mt 16,18-19).
Mais tarde, antes de voltar para o Pai, Jesus determina por três vezes a Pedro: “Cuide de minhas ovelhas.” (Jo 21,15-17). Pedro recebeu a responsabilidade pelo futuro Reino; poderá ligar e desligar, não apenas instruir, mas também organizar e julgar, e isso diz respeito à remissão dos pecados. Os demais apóstolos participam do mesmo poder (cf Mt 18,17), mas somente Pedro é a rocha, o fundamento da comunidade de Deus. Essas determinações de Jesus, construindo sobre Pedro “pedra” a sua Igreja, e dando a ele as chaves do Reino e o poder de ligar e desligar as coisas da terra ao céu e o cuidado de suas ovelhas, se fazem presentes na pessoa do sucessor de Pedro na Igreja de Jesus Cristo, hoje, Bento XVI.
Juntamente com João e seu irmão Tiago, Pedro foi um discípulo privilegiado de Jesus que pode presenciar a glória de Jesus na ressurreição da filha de Jairo: “Jesus não deixou que ninguém o acompanhasse, a não ser Pedro, Tiago e seu irmão João.” (Mc 5,37), quando  da transfiguração: “Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e seu irmão João, e os levou sozinhos a um lugar à parte, sobre uma alta montanha. E transfigurou-se diante deles.” (Mc 9,2) e na humilhação de Jesus no Getsêmani: “Jesus levou consigo Pedro, Tiago e João, e começou a ficar com medo e angústia.” (Mc 14,33). Pedro demonstra a sua fraqueza humana no momento em que Jesus mais precisava dele, negando-o por três vezes (Mt 26,69-75).
É muito comum, nos Evangelhos, Pedro ser colocado em destaque, em primeiro plano: na profissão de fé e na entrega das chaves da Igreja (Mt 16,13-19). Foi nessa oportunidade que Pedro pronunciou a mais célebre profissão de fé e declaração dita por um discípulo: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo.” (Mt 16,16). Por outro lado, quando Jesus antecipava a sua paixão e morte, alertando seus discípulos, cometeu grave erro ao repreender o Mestre dizendo: “Deus não permita tal coisa, Senhor. Que isso nunca te aconteça.” (Mt 16,22). Imediatamente, ouviu a mais severa repreensão de Cristo: “Fique longe de mim, Satanás!” (Mt 16,23). Os fiscais de impostos se dirigiram diretamente a Pedro na cidade de Cafarnaum (Mt 17,24-27); Jesus escolheu a barca de Pedro para pregar às margens do lago de Genesaré (Mt 5,3.10); Pedro tomando a palavra por todos os Apóstolos quando Jesus pergunta se eles também não o querem abandonar: Para quem iremos nós, Senhor. Tu tens as palavras da vida eterna.(Jo 6,68): quando Jesus tentou lavar-lhe os pés (Jo 13,6-10); quando Jesus coloca, definitivamente, suas ovelhas aos cuidados de Pedro (Jo 21,15-17).
Pedro foi agraciado com uma aparição especial de Jesus ressuscitado: “Realmente, o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão!” (Lc 24,34), e conforme atestou Paulo: “... apareceu a Pedro e depois aos Doze.” (1Cor 15,5). Na nascente comunidade de Jerusalém Pedro assumiu a coordenação, providenciando a substituição do apóstolo traidor Judas por Matias (At 1,15-26) e, depois do envio do Espírito Santo por parte de Jesus, quando reunidos em Jerusalém, Pedro foi o primeiro a tomar a palavra em nome da Igreja recém-nascida (At 2,14ss).
Ao ser instrumento de Jesus na cura de um paralítico, Pedro dirige a palavra a todos os frequentadores do Templo de Jerusalém (At 3,1-26). Foi Pedro quem falou diante das autoridades civis e religiosas dos judeus quando foi preso por curar o paralítico e falar sobre Jesus no Templo (4,1-22) e diante do sinédrio (At 5,29-32). Foi Pedro quem pronunciou a sentença para o casal Ananias e Safira, que tentou ludibriar a ação do Espírito Santo na Igreja nascente, tentando tirar partido do dom de Deus (At 5,1-13).
Simão Pedro sempre saía na frente dos discípulos em qualquer situação, fosse para errar ou acertar. Com isso, conseguia grandes elogios e também repreensões por parte de Jesus. Pedro teve experiências ímpares, maravilhosas, e também fracassos vergonhosos. Citemos algumas experiências maravilhosas: andou sobre as águas (Mt 14,29); testemunhou a ressurreição da Filha de Jairo (Lc 8,51); testemunhou a transfiguração de Cristo (Mt 17,1); testemunhou a agonia de Cristo no Getsêmani (Mt 26,37); pescou um peixe que tinha uma moeda na boca (Mt 17,27); coordenou a eleição da escolha de Matias que ficaria no lugar de Judas (At 1,15-25); pregou no dia de Pentecostes (At 2); curou um paralítico na porta do Templo (At 3); enfermos foram curados sob a sua sombra (At 5,15); mediante a sua palavra, morreram Ananias e Safira (At 5,1-10); curou um paralítico (At 9,34); ressuscitou  a discípula Tabita (At 9,40).
Pedro também teve seus momentos de descrença. Quando Jesus foi ao encontro dos discípulos em alto mar com o barco fustigado por uma tempestade, Pedro duvidou: “’Senhor, se és tu, manda-me ir ao teu encontro, caminhando sobre a água’. Jesus respondeu: ‘Venha’! Pedro desceu da barca, e começou a andar sobre a água em direção a Jesus. Mas ficou com medo quando sentiu o vento e, começando a afundar, gritou: ‘Senhor, salva-me’. Jesus logo estendeu a mão, segurou Pedro, e lhe disse: ‘Homem fraco na fé, por que você duvidou’? (Mt 14,22-31). Pedro, com João e Tiago, dorme no maior momento de angústia vivido por Jesus (Mt 26, 36-46). Pedro promete a Jesus que jamais o abandonaria em momento algum: “Ainda que eu tenha que morrer contigo, mesmo assim não te negarei” (Mc 14,29-31) e, no momento em que Jesus mais precisava dele, negou Jesus por três vezes (Mt 26,69-75; Mc 14,66-72). Quando da prisão de Jesus, Jesus chama a atenção de Pedro por desembainhar a espada e ferir a orelha de um dos que o prendiam (Jo 18,10-11). Com todos os demais apóstolos, Pedro foge e se esconde durante a prisão, julgamento e crucificação de Jesus (Jo 20,19).
A tradição da Igreja confirma que os Apóstolos Barnabé e Paulo fundaram a Igreja de Antioquia no ano 42, aproximadamente, e que Pedro foi o seu primeiro Bispo, tendo permanecido na sua direção durante oito anos, de 45 a 53. Foi na cidade de Antioquia que os primeiros seguidores de Jesus Cristo foram chamados de cristãos (At 11,26). Foi em Antioquia que ocorreu o incidente entre Pedro e Paulo sobre a necessidade da circuncisão para conversão, tendo Paulo batido de frente com Pedro que vacilara entre a Lei de Moisés e a graça trazida por Jesus através do seu Evangelho: Pedro estava do lado daqueles judaizantes (judeus convertidos ao cristianismo) que diziam que, para ser cristão, era necessário antes ser circuncidado, conforme a Lei de Moisés, e Paulo não mede palavras para chamar a atenção de Pedro: “Quando Pedro foi a Antioquia, eu o enfrentei em público, porque ele estava claramente errado. [...] Quando vi que eles não estavam agindo direito, conforme a verdade do Evangelho, eu disse a Pedro na frente de todos: ‘Você é judeu, mas está vivendo como os pagãos e não como os judeus. Como pode então obrigar os pagãos a viverem como judeus?” (Gl 2,11.14). Após permanecer oito anos em Antioquia, Pedro foi para Roma onde foi o primeiro Bispo. Ainda, segundo a tradição cristã, Pedro foi preso nos primeiros meses de 67, acusado de ser cúmplice do incêndio que devastou a cidade de Roma. Foi condenado à morte de cruz. A execução foi consumada na colina do Vaticano, no mesmo dia em que Paulo foi decapitado, conforme carta de Clemente, bispo de Roma, escrita em 95, que se encontra no Arquivo do Vaticano: “Por zelo e astúcia o maior e a maioria dos discípulos íntegros (da Igreja) sofreram perseguição e foram levados à morte. Coloquemos diante de nossos olhos o bom Apóstolo São Pedro, o qual foi submetido a um tratamento injusto e cruel, sofrendo numerosas misérias, e assim, tendo dado testemunho do Senhor, foi martirizado, e entrou no lugar merecido da glória”.
A seguir, Clemente menciona Paulo e vários outros eleitos que juntos ou isoladamente, sofreram o martírio “entre nós”. Ainda relativo à maneira da morte de Pedro, possuímos uma tradição, atestada por Tertuliano ao término do segundo século, e por Orígenes (conforme História Eclesiástica, II, Eusebius Pamphilus, Bispo de Caesarea – 265/339), afirmando que Pedro foi crucificado. Orígenes disse: “Pedro foi crucificado em Roma com a cabeça para baixo, como ele tinha desejado morrer”.
O dia do martírio de Pedro também é desconhecido; 29 de junho foi o dia escolhido para a sua festa desde o quarto século, todavia, não existe uma prova concreta de que foi exatamente no dia 29 de junho que Pedro foi martirizado.

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